O Conselho Nacional de Saúde (CNS) integrou a delegação oficial do Brasil na 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), em Nova Iorque, participando da 4ª Reunião de Alto Nível sobre Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) e Saúde Mental.
O encontro reuniu líderes globais, autoridades sanitárias, representantes da sociedade civil e organismos internacionais para deliberar a versão final do documento político que propõe integrar DCNT, saúde mental e atenção primária, com foco em modelos de cuidado equânimes com financiamento sustentável.
A reunião foi o marco final de um longo processo de elaboração de novas diretrizes que culminou na aprovação parcial da declaração política, que propõe uma atenção integral centrada nas pessoas e com base em suas experiências de vida.
Apesar de controvérsias, como a presença do setor privado no texto final, o documento reafirma a Atenção Primária em Saúde como “fundamento resiliente” para ampliação da cobertura, enfatizando sua capacidade de integrar ações de promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação e cuidados paliativos.
Nos painéis multissetoriais e na plenária deliberativa realizadas no penúltimo dia da Assembleia (25/09) foram discutidos os determinantes sociais, econômicos e ambientais das DCNT e da saúde mental, além dos desafios para a coordenação nacional e a governança colaborativa.
Governos de países como Espanha, Costa do Marfim, Estônia, Japão e Suécia apresentaram experiências de integração, destacando estratégias baseadas em equidade, uso de tecnologias digitais, governança pública e participação da sociedade civil.
A declaração política não teve aprovação por consenso ao final, já que o governo dos EUA se apôs a trechos que citavam taxação de ultraprocessados, entre outros pontos.
No entanto, o documento se destaca por legitimar o processo de participação social na saúde como fundamental na formulação e implementação das ações de saúde, destacando em seu texto final a experiência vivida por usuários como chave para a criação de políticas adequadas ao atual cenário de transição.
O documento reconhece que “as pessoas que vivem com doenças não transmissíveis e condições de saúde mental, suas famílias e cuidadores, têm experiências únicas e conhecimento em primeira mão que contribuem para o desenho, implementação e monitoramento de políticas e programas de promoção da saúde, prevenção, diagnóstico, tratamento e cuidados, incluindo reabilitação e cuidados paliativos”.
A participação do CNS reforçou a importância da sociedade civil organizada na formulação e no acompanhamento das políticas públicas de saúde, em diálogo com governos e organismos internacionais.
Para Priscila Torres, conselheira nacional de saúde e integrante da mesa diretora, que compôs a delegação do CNS na Assembleia, o documento final é válido porque reconhece desigualdades estruturais no trato com as DCNT, enfatizando que os mais pobres e vulnerabilizados enfrentam maior carga de doenças crônicas e sofrimento mental.

“Essa lógica orienta a priorização de populações vulnerabilizadas, alinhando-se à política de equidade e às ações nos vários níveis de cuidado.
A declaração traz ainda mais argumentos em defesa desse modelo de formulação de políticas de saúde”, destacou a conselheira.
A proposta discutida ainda estabelece metas globais a serem alcançadas até 2030, com a redução de um terço das mortes prematuras causadas por DCNT.
As metas também incluem alcançar 150 milhões a menos de usuários de tabaco, 150 milhões a mais de pessoas com hipertensão sob controle e 150 milhões a mais de pessoas com acesso a cuidados em saúde mental.
Não há saúde sem Saúde Mental
A semana de alto nível em Nova Iorque também foi marcada pelo evento paralelo da OMS “No health without mental health”, no dia 23 de setembro, que destacou experiências internacionais, compromissos políticos e caminhos para integrar o cuidado em saúde mental aos sistemas de saúde e políticas públicas em todo o mundo.
O Diretor-Geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, abriu o encontro com um forte chamado à ação global.
Ele enfatizou que “não há saúde sem saúde mental” e que os programas de apoio psicossocial devem ser considerados um direito básico, não um privilégio.
Dr. Tedros destacou a necessidade de investimentos voltados especialmente a crianças e jovens, apontando o aumento de 25% nos casos de transtornos mentais durante e após a pandemia de Covid-19, defendendo programas escolares de combate ao bullying e à violência.

A Primeira-Dama da Ucrânia, Olena Zelenski, relatou o impacto devastador da guerra na saúde mental da população.
Ela lembrou casos de crianças traumatizadas e de prisioneiros de guerra que sofreram torturas e fome, ressaltando que mais de 70% dos ucranianos apresentam estresse e ansiedade intensa, com cerca de 10 milhões em risco de desenvolver transtornos mentais severos.
A Ucrânia implementou uma rede de mais de 300 centros de resiliência, espaços comunitários que oferecem apoio social, jurídico e psicológico, além de expandir os centros de saúde mental e treinar profissionais de setores não tradicionais — como bancos e transportes — para lidar com pessoas em sofrimento emocional no cotidiano.
A ex-presidente do Chile e ex-Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, compartilhou a experiência chilena de integração da saúde mental ao sistema de proteção social.
Ela ressaltou a importância de envolver famílias e pacientes nas decisões políticas, combatendo estigmas que historicamente marcaram o atendimento — principalmente de mulheres com depressão. Bachelet também reforçou dados da OMS: mais de 1 bilhão de pessoas vivem com algum transtorno mental, com as mulheres sendo mais afetadas, numa proporção de 1 em cada 7.
Representantes das Filipinas e da África do Sul compartilharam estratégias inovadoras para enfrentar desafios estruturais e sociais, incluindo a rápida urbanização, desigualdades e impactos da pandemia.
O encontro encerrou com um chamado coletivo para transformar declarações políticas em ações concretas.
A OMS reiterou o compromisso de acompanhar a implementação de pactos assumidos e apoiar países na integração da saúde mental nas políticas nacionais.
“A declaração foi feita. Agora, o desafio é levá-la a cada canto do mundo e fazer com que as mudanças aconteçam”, destacou a representante da OMS no encerramento.
Para Fernanda Magano, presidenta do CNS, participar da atividade e conhecer realidades tão diversas faz pensar na integração da Atenção Psicossocial na Atenção Primária do SUS e nos desafios da realidade brasileira.
“Experiências de integração como as apresentadas mostram que as soluções surgem a partir do entendimento das necessidades da população, e a Participação Social em Saúde tem papel fundamental nisso.
Precisamos criar estruturas participativas capazes de responder aos desafios atuais, sempre baseadas na ciência e nas melhores práticas internacionais”, afirmou a presidenta do CNS.
Coalizão da Atenção Primária
Na quarta-feira (24/09), o Conselho Nacional de Saúde participou do debate sobre a Coalizão Global para Atenção Primária, iniciativa lançada pelo Cazaquistão em 2023 e integrada por 18 países, entre os quais o Brasil.
Na ocasião foram debatidas questões centrais da atenção primária à saúde, como compromisso político e liderança, governança, alocação de recursos e engajamento comunitário.
Representantes internacionais enfatizaram que os serviços de saúde primária são o primeiro elo entre os sistemas e as pessoas — o espaço onde condições como hipertensão são diagnosticadas e tratadas, onde a saúde mental deve ser integrada e onde começa o cuidado equitativo.
Três prioridades foram delineadas para ação: investimento de longo prazo, integração de serviços e priorização da equidade, especialmente para populações historicamente deixadas para trás, como comunidades rurais, povos indígenas e pessoas com deficiência.
O encerramento foi marcado por um convite para que a coalizão se torne mais do que um fórum político — uma comunidade global de aprendizagem capaz de compartilhar também fracassos e lições práticas. Com recursos limitados e expectativas crescentes, os países membros foram incentivados a testar e escalar soluções que realmente gerem impacto, mantendo a população no centro das decisões.
Alimentação e DCNT

O último dia de atividades da delegação do CNS em Nova Iorque (29/09) contou com a participação no seminário sobre DCNT e políticas públicas para alimentação saudável, atividade promovida pela conselheira nacional de saúde Paula Johns, representante da ACT Promoção da Saúde no plenário do CNS.
A atividade aconteceu na Universidade CUNY, reunindo estudiosos e especialistas internacionais. A conselheira destacou o papel do Controle Social brasileiro no apoio à ciência e inovação, enfatizando a atuação do CNS no combate ao negacionismo durante a pandemia da Covid-19.
A participação do CNS na semana de atividades em Nova Iorque reforça o compromisso do Brasil com a integração entre saúde mental, DCNT e atenção primária, valorizando a ciência, a equidade e a participação social como pilares de um sistema público de saúde globalmente referenciado.
Fonte: Conselho Nacional de Saúde
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