Pesquisa revela que 33% em média dos custos com medicamentos no SUS é proveniente de judicialização

A divulgação dos resultados revela que a judicialização da saúde impacta negativamente no financiamento da assistência farmacêutica no Brasil.

Redução do financiamento de repasse federal, aumento dos recursos próprios nos estados e municípios e desigualdade regional na distribuição de verbas são apenas alguns dos resultados alcançados pela pesquisa sobre os medicamentos judicializados no Brasil e divulgada no Seminário de Assistência Farmacêutica no SUS, realizado na terça (27/05), no auditório da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), em Brasília.

A presidenta do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernanda Magano, foi uma das integrantes da mesa de abertura e falou sobre a importância da pesquisa para o fortalecimento do controle social no SUS. “A transparência e o acesso público aos dados da pesquisa auxiliam na perspectiva de gastos e demandas pari passu às estratégias que o controle social precisa para traçar as estratégias de fortalecimento do SUS”, destacou Magano.

Um dos dados mais significativos da pesquisa revelou que 58,7% dos municípios responderam que enfrentam gastos com medicamentos judicializados. A frequência de municípios com fornecimento de medicamentos judicializados foi maior nas regiões Centro-Oeste (80,5%), Sudeste (73,3%), Sul (57,6%), e menor nas regiões Nordeste (46,3%) e Norte (49%). Sob a perspectiva do financiamento do SUS, a Assistência Farmacêutica abrange um conjunto de despesas que, em sua maioria, são realizadas pela União, estados, o Distrito Federal e municípios para a oferta e acesso de medicamentos à população.

O diretor do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos da Sectics do Ministério da Saúde, Marco Aurélio Pereira, lembrou que “para uma construção coletiva e intersetorial como é a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (PNAF), é necessário compreendê-la como uma política norteadora de outras políticas nacionais”. O diretor falou sobre os desafios da amliação do acesso da população aos medicamentos e sobre a prioridade no cumprimento dos objetivos do Plano Plurianual de 2024-2027.

“Estamos realizando a ampliação do Programa Farmácia Popular pelo componente especializado, estratégico e básico da Assistência Farmacêutica, do acesso ao serviços de cuidados farmaceuticos no âmbito do SUS e o fortalecimento dos serviços gerenciais e assistenciais nos estados e municípios por meio do Programa de Qualificação da Assistência Farmacêutica (Qualifar).

Judicialização

A judicialização, que está em crescente ascensão, representa um desafio estrutural e recorrente, consumindo grande parte dos recursos que poderiam ser utilizados em outras áreas da saúde. O assessor técnico em Assistência Farmacêutica do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Elton da Silva Chaves, sinalizou que “dos 1.865 municípios respondentes, 1.094 afirmaram que tinham ações judiciais no fornecimento de medicamentos, o que impacta no aumento dos gastos, principalmente, pelo porte populacional dos territórios”, alerta.

Outro dado relevante é que 52% dos municípios afirmaram fornecer medicamentos não incorporados ao SUS por via administrativa, o que levanta questões sobre a gestão e a sustentabilidade da assistência farmacêutica. Participaram da pesquisa gestores de saúde de 25 estados, incluindo o Distrito Federal.A presidenta do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Tânia Mara, enfatizou que “há uma excessiva judicialização com danos reais à organização do orçamento das secretarias. Por isso, é fundamental que a gente revise as bases de financiamento e que tenhamos uma pactuação tripartite realista, com foco em planejamento, e realidade territorial”, disse Tãnia.

Foto: Ascom CNS
Foto: Ascom CNS

Pesquisa

A pesquisa “Assistência Farmacêutica no Sistema Único de Saúde (SUS)” é fruto de um acordo de cooperação técnica (ACT) entre o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com a participação de 1.865 municípios, representando 33,5% do total no país, entre os anos de 2019 e 2023.

Embora a participação dos municípios tenha sido robusta, a coleta de dados ocorreu durante um período sensível eleitoral, o que impactou a resposta de alguns municípios, especialmente aqueles em situações de emergência sanitária, como no Rio Grande do Sul (RS). Durante a apresentação, foi ressaltada a necessidade de aprimorar a qualidade dos registros oficiais e a importância de sistemas de informação mais integrados e eficazes.

Como a judicialização impacta o financiamento da assistência farmacêutica no Brasil?

Judicialização, no contexto jurídico e político, refere-se à crescente intervenção do Poder Judiciário em questões que deveriam ser resolvidas pelo Poder Executivo ou Legislativo, o que afeta tanto a alocação de recursos quanto a sustentabilidade das políticas públicas na área.

No caso da saúde pública no Brasil, só em 2020, foram 76.836 novos casos registrados na 1ª instância do judiciário. Esse número aumentou para 162.046 em 2024, aproximadamente,110,9%., segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A judicialização exige que as secretarias de saúde redirecionem esforços e recursos para lidar com processos judiciais, o que pode desviar a atenção de estratégias mais amplas de gestão e melhoria da assistência farmacêutica, além de trazer incertezas quanto à continuidade do financiamento de medicamentos, uma vez que as decisões judiciais podem variar.

Essa insegurança pode dificultar o planejamento orçamentário e a execução de políticas públicas de saúde, além de incidir diretamente no tratamento das pessoas que dependem dos medicamentos, especialmente, para pacientes com doenças raras ou condições específicas.

Outro aspecto que prejudica a sustentabilidade do SUS é que a judicialização pode influenciar a forma como as empresas farmacêuticas desenvolvem e comercializam novos medicamentos, uma vez que a incerteza em relação ao reembolso e à cobertura pode afetar investimentos em pesquisa em desenvolvimento e inovação.

Cris Cirino

Ascom/CNS


Descubra mais sobre Biored Brasil

Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.

Deixe o seu comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.