Especialistas alertam que o tratamento fragmentado e a falta de diretrizes oficiais deixam milhões de pessoas vulneráveis.
Durante Fórum com líderes de associações de pacientes promovido pela Comissão de Relacionamento com Associações da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), o reumatologista Dr. André Hayata, coordenador da Comissão de Políticas Públicas da SBR, fez um apelo contundente sobre a realidade dos pacientes com dor crônica no Brasil, especialmente aqueles com doenças reumáticas.
Ele defende que o Brasil adote um Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de dor crônica no SUS, com linhas de cuidado estruturadas e financiamento adequado. Segundo o especialista, pacientes com fibromialgia e condições semelhantes não encontram no SUS medicamentos recomendados internacionalmente. “As terapias eficazes foram avaliadas pela Conitec, mas não foram incorporadas, muitas vezes por critérios de custo. Hoje, já existem genéricos acessíveis e eficazes, mas as linhas de tratamento não foram atualizadas”, afirmou.
Além da limitação farmacológica, falta uma rede estruturada para acompanhamento multiprofissional, envolvendo fisioterapia, psicologia e terapia ocupacional. “Não adianta afastar o paciente do trabalho sem oferecer condições de tratamento. É necessário garantir atenção integral”, acrescentou Hayata .
O contraste entre saúde pública e suplementar acentua as desigualdades. Enquanto usuários de planos de saúde têm diagnóstico e acesso rápido a especialistas, os pacientes do SUS enfrentam longas esperas e ausência de terapias. “O paciente do SUS, que é o mais vulnerável, não está contemplado. Isso fere a equidade, princípio fundamental do sistema”, criticou.
Para a SBR, um protocolo específico para dor crônica no SUS traria avanços como a atualização das linhas terapêuticas, a ampliação do acesso a equipes multiprofissionais e a redução da judicialização. Hayata reforça ainda que as novas legislações, como a lei que garante direitos às pessoas com fibromialgia, precisam estar articuladas às políticas nacionais já existentes, como a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Reumatológicas, para garantir efetividade.
Cuidado integral e multiprofissional no tratamento da fibromialgia
O reumatologista Dr. Eduardo Paiva, professor da Universidade Federal do Paraná e membro da Comissão de Dor da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), destacou a urgência de fortalecer a rede de atendimento e o cuidado integral aos pacientes com dores crônicas, como a fibromialgia, no Brasil.
Segundo o especialista, o tratamento da fibromialgia deve ir além do uso de medicamentos. “O grande tratamento é não farmacológico, com foco em atividade física, fisioterapia, terapia cognitivo-comportamental e educação em saúde”, explicou. Ele reforçou que a ausência de profissionais qualificados nas unidades básicas de saúde é um dos principais entraves para garantir esse acompanhamento contínuo e multiprofissional.
Dr. Eduardo ressaltou também que o diagnóstico da fibromialgia é clínico e multifatorial, exigindo escuta ativa e avaliação detalhada por parte do profissional. “Não existe um exame específico. Assim como na enxaqueca, todos os testes podem estar normais, o diagnóstico depende da história e das características da dor relatada pelo paciente”, afirmou. Para ele, investir na formação e atualização dos médicos da atenção primária é essencial para reduzir diagnósticos incorretos e ampliar o acesso ao tratamento adequado.
O reumatologista destacou ainda que a fibromialgia é uma condição real e tratável, marcada por sensibilidade aumentada à dor e impacto significativo na qualidade de vida, mas que pode ser controlada. “A maioria dos meus pacientes que estão bem e sem medicação é porque fazem atividade física regularmente. O remédio é uma ponte para o paciente retomar a vida ativa”, completou.
O Dr. Eduardo Paiva reforçou a importância de que o debate sobre dor crônica avance nas políticas públicas brasileiras. Ele apoia a proposta da SBR de criação de um Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Dor Crônica no SUS, medida que permitiria atualizar linhas de cuidado, incorporar terapias eficazes e garantir a abordagem multiprofissional. “Tratar a dor de forma integral é garantir dignidade, equidade e qualidade de vida aos pacientes reumáticos e com condições crônicas”, afirmou.
Um cenário alarmante para quem convive com dor
Pacientes com fibromialgia ou condições dolorosas persistentes não têm acesso a tratamentos recomendados. A falta de uma rede multidisciplinar, com fisioterapia, psicologia, terapia ocupacional, compromete a efetividade do tratamento. “Não adianta afastar o paciente do trabalho sem oferecer condições de tratamento. É necessário garantir atenção integral”, alertou Hayata.
A SBR defende que o Brasil adote um PCDT específico para dor crônica no SUS, documento que estabeleça critérios diagnósticos, terapêuticos e diretrizes integradas de atenção. Já existe um modelo de PCDT de Dor Crônica disponível como proposta de consulta pública. Serviços e Informações do Brasil
Com esse protocolo, seria possível:
- Atualizar e tornar obrigatórias as linhas de tratamento mais moderna
- Estruturar equipes multiprofissionais no SUS
- Garantir seguimento contínuo e integral dos pacientes
- Reduzir a dependência da judicialização para obter tratamento
Papel das comissões da SBR:
- Comissão de Políticas Públicas da SBR: articula com gestores, reguladores e o CNS para viabilizar políticas baseadas em evidência, equidade e controle social.
- Comissão de Dor da SBR: especializada no manejo da dor em doenças reumatológicas, elabora consensos e recomendações que possam orientar os clínicos e gestores sobre estratégias efetivas de tratamento.
A posição da SBR, representada por Dr. Hayata e Dr. Paiva, reforça a necessidade de alinhar ciência, políticas públicas e equidade. A transformação depende da atuação conjunta entre governo, sociedade civil, especialistas e pacientes para que o PCDT de dor crônica saia do papel e se torne realidade nos municípios.
Neste momento de avanços legislativos e crescente atenção ao tema, também impulsionados por mobilizações políticas e sociais, a Biored Brasil segue mobilizada para que nenhum paciente permaneça à margem do direito ao tratamento digno e integral.
Cris Cirino.