Comissão de Defesa do Consumidor debate em audiência pública sobre Regulamentação das terapias gênicas para o setor farmacêutico

A Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Câmara dos Deputados debateu, no dia (04/10), sobre a Regulamentação das terapias gênicas para o setor farmacêutico. A audiência pública foi solicitada pelos deputados Paulão (PT-AL) e Gilson Marques (Novo-SC), através dos Requerimentos 44/2023 – CDC e 59/2023 – CDC, respectivamente, com o objetivo de instruir o Projeto de Lei 3499/2021, que altera a Lei nº 10.742, de 6 de outubro de 2003, para prever a utilização de critérios diferenciados para a definição dos preços de terapias gênicas, celulares e com células-tronco.

Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e Ministério da Saúde

Daniela Marreco Cerqueira, Secretária Executiva da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e representante do Ministério da Saúde iniciou sua fala explicando as etapas de registro, precificação e incorporação de tecnologias em saúde no Brasil. Sobre a terapia gênica, informou que são produtos novos que chegam ao país, divididos em categorias 1 e 2. Na primeira é analisado se tem alguma inovação, se tem patente daquela molécula e se tem algum ganho de eficácia seja na redução ou não de efeitos adversos ou redução do custo de tratamento. Na segunda, vai trazer os casos omissos que não é possível realizar a precificação nos termos da norma vigente, ou seja, a inovação sem ganhos terapêuticos (produto novo que não atende aos requisitos da categoria 1).

A Dra. Daniela destacou que hoje os produtos biológicos devem crescer significativamente em receita de vendas, e espera-se que as terapias gênicas apresentem o maior crescimento, com um aumento de 1.000% até 2027 no mercado farmacêutico. Informou ainda que hoje no Brasil tem cinco medicamentos para terapias gênicas cadastrados e com preços definidos pela CMED todos eles classificados como casos omissos, pelo fato de não se enquadrarem adequadamente nos critérios definidos na Resolução vigente e pelas especificidades desse produto, principalmente com relação a limitação de evidências clínicas a longo prazo, de segurança e eficácia, o que dificulta a análise dos aspectos fármacos econômicos no momento que definiu o preço, que são no momento preços provisórios, e estão sujeitos a alteração de acordo com algumas características e critérios que foram definidos pela CMED.

Mencionou ainda que as empresas responsáveis por esses cinco medicamentos se comprometeram a enviar nos próximos anos dados de eficácia e segurança de acordo com os critérios definidos para que passem por nova análise dos órgãos envolvidos.

Por fim, salientou que normalmente esses medicamentos são utilizados no tratamento de doenças raras, e grande parte afetam crianças e são terapias relevantes a população, e alguns critérios tem sido utilizado pela Conitec para incorporação dessas tecnologias. Citou ainda com exemplo os zolgensma que foi estabelecido um protocolo de compartilhamento de riscos para que o pagamento dessas terapias possa ser realizado de forma gradual na medida em que o sistema de saúde acompanha a evolução dos pacientes que utilizam esses produtos, citou que esse é um dos modelos que pode ser discutido a partir das tecnologias do sistema de saúde e outros que precisarão serem analisados para avançar em modelos inovadores que permitam o acesso a esses produtos.

Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (ABHH) 

Renato Luiz Guerino Cunha, Membro do Comitê Científico de Transplante de Medula Óssea e Terapia Celular da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (ABHH) salientou que quando se fala em terapia gênica, fala basicamente em transplante de medula óssea que é o tratamento mais antigo. Destacou que do ponto de vista pratico essas células são retiradas do doador e congeladas ou não, pois pode ser um produto in natura também e são repassadas ao receptor.

“Já no caso da terapia gênica, por exemplo, o CAR T-CELL, que também se aplica as demais, a partir do momento que as células saem do paciente, elas passam por um processo de alteração genética muito intensa em um alto nível de tecnologia embarcada, para que essas células possam ter suas alterações corrigidas ou que elas possam ter novas funções que antes elas não exerciam”, explicou.

Assim, o objetivo da terapia é de corrigir defeitos, a hemofilia ou linfócitos vão destruir tumores, finalizou.

Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas)

Antoine Daher, Presidente da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas) destacou inicialmente que falar em terapia gênica é falar em inovação, não é um produto de prateleira, e requer centros especializados que possam se adequar para oferecer tratamentos com uma única intervenção e pode resolver muitos problemas do paciente com doença rara, um vez que cada paciente exige tratamento individualizado, o tratamento ainda é chamado de terapia alvo ou de precisão.

Mencionou que é preciso alterar o Projeto de Lei 10742/2003, para prever a utilização de medicamentos diferenciados para a definição dos preços de terapias gênicas, celulares e com células-troncos. Ressaltou que inovação pressupõe altos investimentos em pesquisa e desenvolvimento para dar acesso às necessidades médicas não atendidas, e que a Resolução 2/2004, não foi feita para terapias inovadoras, e sim para a precificação de medicamentos tradicionais.

Assim, o Dr. Daher indagou como criar mecanismos de precificação capazes de oferecer sustentabilidade ao sistema, de forma a garantir o acesso rápido a pacientes e segurança jurídica aos envolvidos. Criar regras e/ou barreiras para a redução do preço registrado no Brasil pela CMED pode inviabilizar o registro de produtos inovadores no país, então é preciso utilizar o bom senso, completou.

Salientou por fim, que é preciso ser proativo, pois terapias gênicas serão cada vez mais frequentes e é possível que haja uma judicialização, com o valor muito mais caro que a incorporação. É preciso buscar uma solução sustentável que não feche as portas para essa inovação.

Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma)

Renato Porto, Presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) esclareceu inicialmente que esses medicamentos não são experimentais e são registrados no Brasil, aprovados pela Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Destacou que a terapia gênica no Brasil foi provada como totalmente robusta com qualidade de eficácia, segurança e qualidade comprovada pela ANVISA. Disse ainda que é preciso dar acesso e evitar que se crie embargos regulatórios que impeça essa tecnologia de chegar ao paciente, pois toda tecnologia aplicada fora do Brasil é a mesma daqui.

Ressaltou que o preço praticado no Brasil não é o mais alto do mundo, pois o preço é a média dos outros países, e a CMED sempre vai puxar esses valores para baixo. Mencionou que 53,5% do preço desse produto é para a produção, logística, adaptação e desenvolvimento, ensaio clínico e adaptação do tratamento ao paciente, e ainda 46,5% são de impostos praticados no Brasil.

Assim, destacou que é preciso fazer uma reflexão sobre isso, pois é a carga tributária sobre medicamento mais alta do mundo, e isso pode ajudar na sustentabilidade do sistema de saúde, que é o pilar central da Interfarma. Não adianta ter medicamentos nas fábricas, os medicamentos precisam chegar as pessoas no momento certo e por um valor adequado, finalizou.

Sociedade Brasileira de Genética Médica e representante da Associação Médica Brasileira (AMB) 

Salmo Raskin, Sociedade Brasileira de Genética Médica e representante da Associação Médica Brasileira (AMB), disse que enxerga com grande entusiasmo e alívio o progresso das terapias gênicas chegar aos pacientes de forma segura e eficaz depois de tantos anos de pesquisa, de insucessos e melhorias.

Destacou que é preciso que todas as tecnologias gênicas sejam incorporadas de maneira segura e eficaz, porque 13 milhões de brasileiros têm doenças raras e boa parcela deles no futuro poderão se beneficiar de alguma terapia gênica.

Ressaltou que é a favor da incorporação de terapias gênicas no Sistema de Saúde Brasileiro, mas entende que para serem incorporadas e se tenha o acesso, além de seguras e eficazes elas devem ter um precificação justa, porque ao contrário o processo será emperrado e o paciente não terá acesso.

Para o enriquecimento do dialogo elencou em contraposição alguns pontos: disse que não foi dito que a maioria das cestas dos países são países desenvolvidos de primeiro mundo e não em desenvolvimento como o Brasil; também a maioria desses países não possui sistema de saúde pública e regulação de preços; ainda não foi dito que os preços nesse países são diferentes do que são repassados aqui porque existem naturalmente políticas de desconto e acordo de confidencialidade que nos outros países não são repassadas tais informações.

Então acredita que é preciso tomar cuidado e talvez pensar na possibilidade de incorporar outros países mais semelhantes ao Brasil nesta cesta de países onde se compara a média de preços e também solicitar que as indústrias forneçam as suas políticas de desconto para esses países para saber efetivamente qual é o valor vendido para determinado medicamento ou terapia gênica, pontuou.

Mencionou que é possível que a CMED não tenha conhecimento dos preços que são praticados, para ele seria muito importante essa transparência de preços para que todos pudessem entender porque os preços são caros. Citou por exemplo que não há conhecimento de ajuste negativo do preço e somente o ajuste positivo do preço e a cada ano é corrigido o preço dos medicamentos e da terapia gênica.

Raskin disse acreditar que a CMED deveria aumentar sua representatividade na população, ter membros da sociedade de especialidade, da sociedade civil, do CADE, da Anvisa e da ANS que terá regulamentar esses preços depois. Assim, sugeriu que nessa atualização em andamento, não apenas nas terapias gênicas, poderia se pensar numa modificação mais ampla da CMED.

Discordou sobre a fala de alguns dos participantes de que o preço da CMED é inicial e que o preço final será diferente, o ponto é verdade, mas a CMED não consegue precificar de forma mais precisa o real valor daquele medicamento como uma terapia gênica que é na casa dos milhões e até bilhões de reais. Ressaltou ainda que a indústria tem que ter o seu lucro para não desmotivar a buscar novas tecnologias para as doenças raras, mas que seja um lucro mais realista.

Por último, alertou que o medicamento Trikafta para o tratamento de Fibrose cística uma doença rara, foi precificado pela CMED com as regras utilizadas hoje, em R$ 112 mil reais a caixa, e o preço final desse medicamento depois de todas as etapas da Conitec ficou por R$ 36 mil reais a caixa. Assim, qual era o lucro que a empresa previa, e o que fez a CMED aceitar a precificação de 112 mil reais, indagou.

“Alguma coisa está fora da ordem”, destacou. “E por isso é muito importante essa audiência pública para que possa melhorar o sistema, e isso mostra que a negociação quase ficou inviabilizada, e isso serve de alerta para que essa terapia atinja o maior o número de pessoas”.

Ressaltou por fim, que o texto do PL 3499/2021 está um pouco superficial, pois não detalha como a CMED usaria critérios para precificar as terapias gênicas, outro PL 5591/2020, tramitando na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), do Senador Fabiano Contarato (PT-ES), já se aprofunda em todos esses aspectos e traz a tona todos esses questionamentos.

Finalizou parabenizando todas as iniciativas de precificação da CMED, com eficácia e segurança, mas que é possível encontrar um equilíbrio melhor do temos hoje.

Fonte: NK Consultores.

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