Maternidade nas doenças reumáticas: com planejamento, um sonho possível

“Você não poderá ser mãe”. Infelizmente, essa é uma das frases mais ouvidas em consultório por mulheres que têm doenças reumáticas. “Quando o médico me perguntou qual era meu sonho e eu disse ser mãe, ele respondeu: ‘esquece’”, conta Juliana Fernandes, que convive há mais de 34 anos com a artrite reumatoide. 

O mito de que mulheres com doenças reumáticas não podem engravidar ainda persiste na jornada de muitas pacientes. Isso acontece por conta da falta de informação e pelo despreparo de alguns profissionais de saúde. 

A gestação pode ser desafiadora, por ser de alto risco, mas com planejamento é viável. “A gestação nessas mulheres é totalmente possível. É fundamental que ocorra um diálogo e um acompanhamento do paciente com o reumatologista para planejar o melhor momento. É importante que a doença esteja em remissão”, explica Isadora Jochims, médica reumatologista do Hospital Universitário de Brasília (HUB). 

Planejamento da gravidez é o ideal: algumas medicações precisam ser suspensas

O primeiro passo é fazer o planejamento familiar, para que a gestação ocorra quando tudo estiver bem, o que significa que a doença deve estar em remissão para que haja o menor risco possível tanto para o bebê, quanto para a mãe. Além disso, algumas medicações devem ser suspensas ou substituídas por outras.  

“Tomando a decisão de qual o melhor momento para engravidar, o reumato irá avaliar a troca da medicação, porque existem medicamentos contraindicados na gestação, como o micofenolato, o metotrexato, leflunomida, entre outros. Tem que suspender ou fazer a troca pelo menos 6 meses ou mais antes de engravidar”, alerta Isadora.

Por outro lado, alguns medicamentos são recomendados e podem ajudar tanto a mãe quanto o bebê. “Por exemplo, a hidroxicloroquina em pacientes com lúpus, diminui o risco de bloqueio cardíaco em que tem anticorpos que ultrapassam a barreira placentária e podem levar ao lúpus neonatal. Sendo assim, a medicação diminui o risco de trombose e de perda gestacional”, explica a profissional. 

Quem tem doença reumática pode ter dificuldade de engravidar?

“Isso vai depender de qual doença, qual gravidade e se a doença está em atividade ou não e qual medicação está em uso”, conta a médica reumatologista. “De forma geral, a atividade inflamatória sistêmica diminui a fertilidade e aumenta o risco de complicação“.

A especialista destaca que apenas em alguns casos a gestação pode ser contraindicada por oferecer risco à mãe. “Vai depender da doença e se há envolvimento com órgãos nobres, entre eles: valvulopatias cardíacas, hipertensão pulmonar, pneumopatia grave e avançada e doença renal crônica. Essas condições podem contraindicar a gestação”.

Juliana com seu esposo e os três filhos. A artrite reumatoide não a impediu de realizar seu sonho.

Gestar nas doenças reumáticas é um sonho possível 

Mãe de três – Matheus, de 19 anos, Lucas, de 8 anos e Alice, de 6 anos – Juliana conta que com o pré-natal de perto as três gestações foram ótimas e sem nenhuma complicação. “Eu fiquei muito bem nas minhas três gestações e no puerpério, também. Não tive dores da artrite reumatoide. Fiz o desmame de medicações e alcancei a remissão antes de engravidar”. 

História parecida foi vivida pela Carol Benevides, que tem lúpus e é mãe da Rafaela, de 15 anos. “Em 2008, a internet não era esse mar de informações como vemos hoje. Apenas, o médico me alertou que era uma gravidez de alto risco e que a partir daquele dia era para suspender todas as medicações. Segui com acompanhamento de perto do reumatologista e do obstetra. O pré-natal foi bem rigoroso e seguiu muito tranquilo”, conta Carol, que quando engravidou tinha recebido o diagnóstico de lúpus há apenas 8 meses. 

Desafios de ser mãe e conviver com doença reumática

Como toda jornada, a da mãe com doença reumática tem seus desafios, mas também uma bagagem extra, como diz Carol. “São diversos medos adicionais que acrescentamos nessa lista da maternidade que já traz por si só mil perguntas. Porque além de se preocupar com o crescimento e desenvolvimento natural dos filhos, carregamos uma bagagem extra de preocupações com relação a ter passado essa genética tão complexa para eles e o constante receio da doença acordar e não estarmos presentes em momentos especiais.” 

Carol, que convive com lúpus, com sua filha Rafaela.

Já para Juliana, que convive com a artrite reumatoide, conciliar a maternidade com as limitações da doença no dia a dia de cuidados dos filhos é um desafio, porém superável. “Não é fácil muitas vezes não levantar da cama pela fadiga ou dores crônicas e ver seu filho te pedindo algo. Eu faço devagar, no meu tempo. Mas a vontade de ser mãe é e sempre foi maior que minhas limitações. Precisamos também ter uma rede de apoio, uma parceria, que para nós autoimunes faz total diferença”, conta. Nas redes sociais, ela compartilha sua jornada como mãe, mulher e ajuda outras pacientes que convivem com artrite reumatoide no @jufernandes_ar. 

Ter uma rede de apoio é fundamental para deixar a maternidade mais leve. E, é por isso, que atualmente Carol se dedica a ajudar mulheres com lúpus. “Procuro ajudar a comunidade de pessoas com lúpus através de um grupo de apoio que participo, e sempre ser uma boa fonte de conhecimento para quem me procura e quer entender um pouco mais sobre a doença”, conta. 

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